O post de hoje surge de um cruzamento de leituras diversas que, de forma feliz, me levaram a mais uma reflexão.
A primeira leitura (que recomendo), vem da London Business School. Da autoria do Prof. Julian Birkinshaw, o artigo chama-se “Play hard, work hard”. Nesta peça de estudo e reflexão, o autor expõe diversas conclusões a que chegou nos seus estudos aplicados ao contexto organizacional.
Neste caso concreto, o tema central é aquilo a que eu chamo o factor P – de “play”, e não de “preguiça” 🙂 – e a forma como influencia o nosso desempenho profissional.
O factor P pode ser explicado em português como a “componente lúdica” do nosso trabalho. No estudo do autor, está directamente relacionado com a capacidade de participar em redes sociais e estar ligado, numa análise centrada na geração da Web 2.0.
Eu prefiro uma abordagem mais lata, e falo do prazer que tiramos do nosso trabalho. Este é um tema que me é particularmente caro nesta fase da vida, em que eu posso afirmar sem qualquer tipo de dúvida que faço aquilo que gosto. Esta afirmação é radicalmente diferente de outra, aparentemente parecida, que postula que gostamos daquilo que fazemos.
Aparentemente igual, certo? Mas não é verdade. No primeiro caso, assumimos que fazemos aquilo que nos dá prazer e realiza, aquilo em que podemos aplicar plenamente os nossos talentos e que nos permite obter o máximo de valorização percebida e recompensa potencial. No segundo caso, cumprimos um papel, que tem uma componente de coisas que até gostamos de fazer, e que tentamos que compense claramente as coisas que não gostamos de fazer (e que também temos de fazer). Isso significa que eu reparto energias entre produção positiva e produção negativa, sendo que a segunda me consome imensos recursos, tempo e energia.
Muitas vezes aceitamos esta situação por estarmos presos por aquilo a que eu chamo “algemas douradas” – um estatuto socialmente invejável, uma remuneração fixa atraente, sinais exteriores de riqueza, etc. -, que justificamos manter por não podermos abdicar do nosso “estilo de vida” (habitualmente sujeito à cosmética dos “compromissos e responsabilidades assumidas”)
Quando vemos que o potencial de ganhos é exponencialmente superior ao concentramo-nos no nosso talento, aí decidimos ganhar coragem para mudar de foco. Sugiro que leiam o livro do Tim Ferriss – 4 Horas por Semana -, que nos explica como aquilo que verdadeiramente interessa é levar o estilo de vida que um milhão de dólares nos pode proporcionar, e não propriamente ter ou ganhar o tal milhão de dólares (e isto faz toda a diferença!).
Mas voltemos à peça da LBS – esta peça reforça a ideia de que é tonto e inútil tentar travar o acesso dos colaboradores às redes sociais: elas estão “embebidas” no modus operandi das novas gerações, e elas vão sempre encontrar forma de se relacionarem. Em vez de tentar travar o fenómeno, faz mais sentido tentar aproveitá-lo:
- Dando liberdade de acesso e pedindo responsabilidades mais pelos outputs que pelos inputs;
- Promovendo a extranetworking como forma de capturar conhecimento relevante para a organização;
- Promovendo a confiança e ganhando maior commitment;
- Libertando as pessoas da tradicional desconfiança face aos “superiores hierárquicos”
Sobre este tema li um artigo deliciosamente mordaz e irónico do João Vieira da Cunha no Diário Económico, que recomendo vivamente: chama-se Blogs e Twitter e goza descaradamente com o provincianismo de alguns “gestores controleiros” que ainda pululam no nosso tecido empresarial.
Sobre a tentação controladora dos nossos gestores, sugiro a leitura dos meus posts:
Sobre o advento da Web 2.0 e das redes sociais, sugiro a leitura dos meus posts e artigos:
- Web 2.0 – a competitividade pós-capitalista
- Web 2.0 nas organizações
- Corporate Social Networks
- A Pesada Herança de Roma
- Falsos Dilemas Éticos nas Empresas
Ainda sobre a liberdade e o talento, sugiro a leitura dos meus posts:
- O Paradoxo de Ícaro
- Make friends, not war
- Genuinidade Empresarial
- O problema do talento está no cérebro
Votos de boa reflexão e façam o favor de ser felizes (dá saúde e dinheiro 🙂 !)
Tenho seguido atentamente o seu blog, com o qual aprendo bastante, mas não posso deixar de lhe perguntar:
– está a trabalhar em Portugal?
– gere alguma empresa?
É que me parece que o conceito da responsabilização dos trabalhadores não funciona de forma tão eficaz no nosso país. Da mesma forma que me parece uma utopia querer que as empresas, em Portugal, assumam o seu componente social e os prejuízos inerentes (a propósito de outro post onde falava sobre a maternidade nas empresas).
A realidade está muito longe do ideal.
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Boa tarde Ana!
Muito obrigado pelo seu comentário, que me deu oportunidade para explicar melhor o meu ponto de vista.
Começando por responder às suas questões essenciais: a) sim, trabalho em Portugal e com muito gosto 🙂 b) e sim, tenho tido responsabilidades de gestão em empresas, tanto de gestão portuguesa como de gestão internacional.
E é precisamente por isso que escrevi o que escrevi e penso o que penso. Permita-me clarificar: a) porque já trabalhei em contextos nacionalmente e culturalmente diversos, sei que não estamos fadados para a mediocridade; b) também por isso não ignoro que temos ainda um longo caminho a percorrer (e por isso escrevo o que escrevo e procuro praticar o que penso). O problema não é do país (boas e más práticas há em todo o lado do mundo), mas sim do grau de preparação dos gestores e dos próprios colaboradores das empresas.
Enquanto o grau de preparação e educação for baixo, a tentação de cair em práticas imediatistas ou em estilos de gestão/psicologia tirados da “literatura de estação de serviço” é muito grande. Já vi isso acontecer e sei o resultado que dá… não é bom, como deve saber.
Também já vi e já implementei boas práticas e sei o retorno que dá. Por isso não olho para o exercício da maternidade como algo que seja um prejuízo do ponto de vista organizacional. Algumas das colaboradoras mais motivadas e produtivas que tive, tiveram oportunidade de ser mães em pleno e retribuíram generosamente essa opção de gestão que a organização assumiu.
A realidade está muito longe do ideal? Sim. É utopia querer mais, ser mais exigente e explicar que compensa economicamente fazer melhor? Não. É apenas sinal de que não desistimos de dar o nosso contributo para o progresso do nosso país.
É uma longa jornada? Sim. Tem obstáculos pelo caminho? Claro! Vale a pena? Sem dúvida 🙂 !!!
Aceite um abraço amigo deste gestor português em Portugal, em vésperas de partida para Luanda 🙂
Ricardo
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